O psicólogo James Davies revelou os bastidores da construção do DSM 3, manual que até hoje fundamenta as bases da prática psiquiátrica. Basta conhecer para ver que "o rei está nu".
Eu consigo compreender e concordar com muitos dos pontos que o movimento da antipsiquiatria vem levantando mas ao mesmo tempo não consigo simplesmente ignorar o fato de que muito dessa "ciência meio capenga" ajuda pessoas constantemente, não falta provas da eficiência de inúmeros medicamentos para salvar vidas e melhorar vidas, relatos pessoais, anedóticos, por exemplo no: https://www.drugs.com/ na página de reviews, e em inúmeros subs do reddit. E eu sou a prova viva da importância da existência das medicações psiquiatricas. A questão é que ao menos pela minha experiência e de muita gente aqui no Brasil, os psiquiatras nem estão muito preocupados em classificar exatamente o seu diagnóstico num papel, e sim tratar o problema, porque no fim das contas temos um grupo relativamente pequeno de farmacos para um milhão de transtornos então torna-se quase inutil ficar classificando exatamente a variação do transtorno de alguém.
É obvio que devem existir motivos bem fortes para isso ser de interesse do mercado, da "big pharma" etc, mas não gosto muito do discurso de que tudo na medicalização do ser humano está errado e é negativa, e muitas vezes o discurso anti psiquiatria faz parecer isso. Obviamente que isso não é um ataque a seu texto, foi ótimo re-ler a visão de Spitzer sobre isso e tudo mais, estou apenas divagando à respeito.
Acho que é muito importante e muito produtivo o debate, e pra mim é muito útil e interessante saber o que as pessoas estão pensando sobre estes temas.
Esta questão que você traz é muito relevante e merece ser muito discutida, pois a psiquiatria não é apenas uma teoria, mas uma prática - que frequentemente está bem distante inclusive desta teoria, e disso tenho prova bem concreta com a prática clínica dos psiquiatras que acompanham, que se pautam muito mais na "tentativa e erro" do que em construtos teóricos ou estudos clínicos (que, diga-se de passagem, raramente envolverm a polifarmácia, por exemplo, uma prática comum dos médicos).
É também desse acompanhamento, e do contato com muitos pacientes meus que são também pacientes psiquiátricos, que vejo que muitas pessoas são muito gratas e satisfeitas ao uso que fazem dos remédios. E acho que isso merece ser discutido sob diferentes aspectos.
Vou tentar depois fazer uma postagem dialogando mais com isso, mas deixo aqui uma ideia da psiquiatra Joanna Moncrieff que considero relevante (sobre a qual já falei aqui em algum texto), que é a de sair de um "paradigma centrado na doença", em que se considera (falsamente) que há uma "disfunção cerebral" causadora de uma doença e que as drogas "consertariam", e passa a se pensar um "paradigma centrado nas drogas", em que se analisa os efeitos fisiológicos das substâncias, considerando seus efeitos totais, e considerando que esses efeitos são universais e não específicos (não são ações que ocorrem apenas em pessoas com tal ou qual quadro clínico), e aí pode-se considerar adequadamente o custo-benefício do uso de tal ou qual substância (que como vc disse no seu comentário, são poucas pra muitas "doenças", o que é mais um indício de sua não-especificidade).
E a pessoa pode fazer uma escolha consciente e informada a partir disso, sabendo inclusive quais os riscos que corre - efeitos de retirada de drogas etc. Isso seria o ideal, na minha opinião: uma escolha livre, consciente e bem informada. Sabendo também de alternativas, é claro.
Fala Fernando, obrigado por responder! Certamente, Su resposta é bem lúcida e eu adoraria ver algum texto novo seu dialogando com essa temática (quando os medicamentos são realmente necessários versus o uso indiscriminado e ignorante) hoje mesmo minha esposa passou por uma experiência do único psiquiatra da cidade pelo sus, indicar nitidamente errado, tecnicamente fora de qualquer teoria um modo de usar determinado medicamento psiquiátrico, e infelizmente isso é rotina aqui, uma espécie de monarquia psiquiátrica sei lá que termo usar. Mas é o único, dono da razão. De qualquer forma, estou divagando um pouco, porém é um assunto que me apaixona, porque ao mesmo tempo que flerto com a visão rebelde e filosófica da anti psiquiatria, tenho uma impressão de isso ser muito conspiracionista (pessoas dizendo que esquizofrenia não existe e é um constructo social, que em outras sociedades e tribos os esquizofrênico seriam os xamãs, coisa do tipo...)esse é um terreno muito arenoso e fácil de cair em falácias, e ainda que a psiquiatria verdadeira seja cheia de falhas (teorias fracas como as dos neurotransmissores sendo protagonistas da saúde mental), muitos dos mecanismos por de trás dela são eficientes, reais, e vemos benefícios sólidos. Porém sem dúvidas o problema maior ao meu ver, como você comentou, não é o uso ou não de medicamentos (defendo a polifarmacia em situações específicas, ex: bipolaridade tipo 2 com comorbidades (tdah, autismo, não sei qual vai em qual ordem, sou apenas um interessado independente Hehe), muitas vezes é necessário um regulador de humor, um antipsicotico, um estimulante e ainda um gabaergico ou equivalente. Mas voltando: o problema não são os medicamentos, são os profissionais de baixa qualidade, e sempre sempre muito arrogantes, cheios de si e donos da verdade. É um inferno chegar com conhecimento querendo dialogar saudável com eles sem que entrem na defensiva. Enfim, desculpe o textão.
Eu consigo compreender e concordar com muitos dos pontos que o movimento da antipsiquiatria vem levantando mas ao mesmo tempo não consigo simplesmente ignorar o fato de que muito dessa "ciência meio capenga" ajuda pessoas constantemente, não falta provas da eficiência de inúmeros medicamentos para salvar vidas e melhorar vidas, relatos pessoais, anedóticos, por exemplo no: https://www.drugs.com/ na página de reviews, e em inúmeros subs do reddit. E eu sou a prova viva da importância da existência das medicações psiquiatricas. A questão é que ao menos pela minha experiência e de muita gente aqui no Brasil, os psiquiatras nem estão muito preocupados em classificar exatamente o seu diagnóstico num papel, e sim tratar o problema, porque no fim das contas temos um grupo relativamente pequeno de farmacos para um milhão de transtornos então torna-se quase inutil ficar classificando exatamente a variação do transtorno de alguém.
É obvio que devem existir motivos bem fortes para isso ser de interesse do mercado, da "big pharma" etc, mas não gosto muito do discurso de que tudo na medicalização do ser humano está errado e é negativa, e muitas vezes o discurso anti psiquiatria faz parecer isso. Obviamente que isso não é um ataque a seu texto, foi ótimo re-ler a visão de Spitzer sobre isso e tudo mais, estou apenas divagando à respeito.
Oi Thomas, muito obrigado pelo comentário!
Acho que é muito importante e muito produtivo o debate, e pra mim é muito útil e interessante saber o que as pessoas estão pensando sobre estes temas.
Esta questão que você traz é muito relevante e merece ser muito discutida, pois a psiquiatria não é apenas uma teoria, mas uma prática - que frequentemente está bem distante inclusive desta teoria, e disso tenho prova bem concreta com a prática clínica dos psiquiatras que acompanham, que se pautam muito mais na "tentativa e erro" do que em construtos teóricos ou estudos clínicos (que, diga-se de passagem, raramente envolverm a polifarmácia, por exemplo, uma prática comum dos médicos).
É também desse acompanhamento, e do contato com muitos pacientes meus que são também pacientes psiquiátricos, que vejo que muitas pessoas são muito gratas e satisfeitas ao uso que fazem dos remédios. E acho que isso merece ser discutido sob diferentes aspectos.
Vou tentar depois fazer uma postagem dialogando mais com isso, mas deixo aqui uma ideia da psiquiatra Joanna Moncrieff que considero relevante (sobre a qual já falei aqui em algum texto), que é a de sair de um "paradigma centrado na doença", em que se considera (falsamente) que há uma "disfunção cerebral" causadora de uma doença e que as drogas "consertariam", e passa a se pensar um "paradigma centrado nas drogas", em que se analisa os efeitos fisiológicos das substâncias, considerando seus efeitos totais, e considerando que esses efeitos são universais e não específicos (não são ações que ocorrem apenas em pessoas com tal ou qual quadro clínico), e aí pode-se considerar adequadamente o custo-benefício do uso de tal ou qual substância (que como vc disse no seu comentário, são poucas pra muitas "doenças", o que é mais um indício de sua não-especificidade).
E a pessoa pode fazer uma escolha consciente e informada a partir disso, sabendo inclusive quais os riscos que corre - efeitos de retirada de drogas etc. Isso seria o ideal, na minha opinião: uma escolha livre, consciente e bem informada. Sabendo também de alternativas, é claro.
Fala Fernando, obrigado por responder! Certamente, Su resposta é bem lúcida e eu adoraria ver algum texto novo seu dialogando com essa temática (quando os medicamentos são realmente necessários versus o uso indiscriminado e ignorante) hoje mesmo minha esposa passou por uma experiência do único psiquiatra da cidade pelo sus, indicar nitidamente errado, tecnicamente fora de qualquer teoria um modo de usar determinado medicamento psiquiátrico, e infelizmente isso é rotina aqui, uma espécie de monarquia psiquiátrica sei lá que termo usar. Mas é o único, dono da razão. De qualquer forma, estou divagando um pouco, porém é um assunto que me apaixona, porque ao mesmo tempo que flerto com a visão rebelde e filosófica da anti psiquiatria, tenho uma impressão de isso ser muito conspiracionista (pessoas dizendo que esquizofrenia não existe e é um constructo social, que em outras sociedades e tribos os esquizofrênico seriam os xamãs, coisa do tipo...)esse é um terreno muito arenoso e fácil de cair em falácias, e ainda que a psiquiatria verdadeira seja cheia de falhas (teorias fracas como as dos neurotransmissores sendo protagonistas da saúde mental), muitos dos mecanismos por de trás dela são eficientes, reais, e vemos benefícios sólidos. Porém sem dúvidas o problema maior ao meu ver, como você comentou, não é o uso ou não de medicamentos (defendo a polifarmacia em situações específicas, ex: bipolaridade tipo 2 com comorbidades (tdah, autismo, não sei qual vai em qual ordem, sou apenas um interessado independente Hehe), muitas vezes é necessário um regulador de humor, um antipsicotico, um estimulante e ainda um gabaergico ou equivalente. Mas voltando: o problema não são os medicamentos, são os profissionais de baixa qualidade, e sempre sempre muito arrogantes, cheios de si e donos da verdade. É um inferno chegar com conhecimento querendo dialogar saudável com eles sem que entrem na defensiva. Enfim, desculpe o textão.